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Um novo brasileiro para um Brasil novo
7 de fevereiro de 2022
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O caminho para a renovação e a modernização do Brasil depende de a classe média tomar consciência de sua falta de identidade e assumir a responsabilidade pelo processo sócio-cultural do país.

A falta de identidade se expressa psicologicamente quando nos identificamos com o outro e adotamos as atitudes características de nosso modelo; quando estabelecemos relações infantis referenciadas no nosso modelo familiar.

Quando não há identidade, não há também o respeito à Lei que, na infância, é simbolizada pela autoridade da figura paterna. O hábito brasileiro de utilizar apenas o nome próprio, deixando em segundo plano o nome de família, deixa evidente a falta da figura paterna. Perpetuando a maneira pela qual a mãe chama o filho, ou seja, pelo nome próprio, nos apresentamos e nos comunicamos como crianças. No mundo de hoje quem estaria em condições de ser reconhecido apenas pelo seu nome próprio?

A classe média brasileira sem identidade deixa-nos a todos, sociologicamente, como crianças, e incapazes de responder pelo encargo social que cabe a ela de manter o equilíbrio e a coesão da sociedade.

Essa falta de identidade do Brasil de um modo geral chega a tal ponto que se sustenta o uso do chamado ‘ ‘bom português”, o idioma da “mãe colonizadora”, apesar de se reconhecer a existência e a importância de um verdadeiro idioma brasileiro. Exemplo claro disto é o hábito lingüístico de usar o Você.

Sem identidade, usa-se o Você para a segunda pessoa. Sabemos que o Você corresponde à terceira pessoa da conjugação verbal e que isto significa distanciar entre si os dialogantes. Psicologicamente, distância significa falta de contato e até falta de confiança. O Você é uma corruptela de Vossa Mercê. E um tratamento diferenciado para demonstrar respeito e consideração o qual se perdeu no tempo: Vossa Mercê, Vosmicê, Você. Esse tratamento respeitoso hoje se tornou um tratamento entre iguais. Mas, na verdade, só existe igualdade quando existe identidade. O tratamento entre iguais é Tu.

A falta de identidade também se expressa pelo egoísmo. O egoísmo provoca falta de respeito pelo outro e resulta em violências sociais de toda natureza. Por exemplo, o egoísmo de empresários milionários os leva à explorar empregados e consumidores através de comportamentos semelhantes aos dos colonizadores. Qual seria a postura da atual classe média brasileira diante disto? Sem identidade, ela penderia para a elite “colonizadora” ou para a maioria pobre da população objeto daquele egoísmo?

A falta de identidade é um grave problema que não pode ser negligenciado.

A identidade só surge quando se alcança a maturidade individual e social, e se ultrapassa a dependência e a idenficação com um modelo. O Brasil tem potencialidade para uma expressão sócio-cultural madura que não seja copiada ou importada. Mas se faz evidente um certo complexo de inferioridade devido a essa falta de identidade.

A classe média brasileira precisa se identificar com o Brasil em vez de se identificar com a elite empresarial que, no mundo todo só tem uma nacionalidade: o dinheiro. Se a classe média brasileira assumir a identidade do Brasil, a maioria pobre do povo brasileiro poderá ter nela um modeIo saudável que propicie o seu amadurecimento.

Assumir a identidade do Brasil significa assumir a responsabilidade pelo processo sócio-cultural do país. Significa buscar a identidade genuína de cada brasileiro. Significa estabelecer o valor semântico da linguagem a fim de permitir uma comunicação verdadeira que facilite a transformação de valores individuais e sociais. Significa transformar o Brasil, um país infantil, em um país realmente jovem e que valoriza suas próprias energias. Significa assumir as riquezas naturais que o país possui. Significa assumir sua beleza e sua vitalidade.

Assumir a sua própria identidade permitirá ao Brasil elaborar um projeto objetivo e viável que, educando os educadores, criaria uma verdadeira revolução cultural. Esse projeto poderá ser coordenado por uma comissão interdisciplinar formada por cientistas sociais de todos os matizes e vinculado ao Ministério da Educação que o supervisionaria e lhe garantiria os recursos necessários. Ele se valeria da estrutura escolar e da mídia, com destaque para a televisão como maior e melhor meio de atingir a grande maioria dos brasileiros, educando-os através de mensagens que lhes levem informação e cultura e não apenas espetáculo. O grande objetivo desse projeto será renovar e modernizar o Brasil com identidade e responsabilidade.

Federico Navarro
Maria Beatriz de Paula
Publicado na revista Energia, caráter e sociedade, 1994

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