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A Concha em que vivemos
18 de julho de 2017
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Era uma vez num coral de recifes, uma grande comunidade de moluscos que moravam em suas conchas e eram protegidos dos perigos do oceano pela barreira criada por esta proteção dos arrecifes e pelas conchas, que carregavam em suas costas.

Suas atividades diárias compunham-se de buscar alimento e proteger os membros de seu grupo dos inimagináveis perigos que rondavam pelo oceanos: peixes famintos, ondas gigantes, monstros marinhos… Então, sempre havia um deles guardando as fronteiras, que à menor sensação de perigo, soava o alarme e todos se escondiam dentro de suas conchas muito duras.

Para onde quer que fossem, esses pequenos animais carregavam em suas costas essa carapaça, que faziam com que se sentissem seguros. Ora, ninguém nem imaginava que existisse outra coisa que não fosse essa vida que levavam, na procura de comida e segurança. Cada qual por si, e todos protegidos por este grande arrecife.

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Cada qual por si, e todos protegidos por este grande arrecife.

Com o passar do tempo, a comunidade só crescia e sentiam-se cada vez mais seguros, uma vez que nada acontecia ali.

Então, certa feita, chegou a este grupo um molusco novo, que havia crescido na praia, onde se escondia dentro da areia, correndo o risco de ser devorado pelas aves, que por ali voavam. Num dia uma forte tempestade, de ondas gigantes, raios e mar em fúria arrancou sua concha e o arremessou no mar, sozinho.

Ele nunca tinha sentido algo tão diferente: uma sensação de medo e ao mesmo tempo uma senso de liberdade. Não conseguia compreender, porque ele olhava o mundo de um ângulo que nunca tinha visto: sem a segurança de sua concha, num mar aberto, cheio de novos perigos, que nunca tinha enfrentado: peixes e outros seres marinhos. Entre um movimento aqui e uma nadada ali, deu-se conta que o oceano era muito maior que a praia onde ele vivia e as possibilidades pareciam ser infinitas, mas sentia-se incomodado, por não ter uma concha que o protegesse mais, que dava formato para seu corpo, que o dava conformidade com os de sua espécie. O que seria ele agora? Como ele poderia explicar tudo isso para os outros? E essas novas sensações…

Até que o mar o conduziu a este arrecife, onde morava a comunidade dos moluscos.

Ao chegar nos arrecifes, sem nenhuma concha, aqueles moradores ficaram escandalizados. “Como pode alguém se expor dessa forma?”, perguntou o ancião. “Ele não segue os padrões divinos!”, exclamou o sacerdote. “Precisa ser contido, antes que influencie nossa comunidade e coloque todos em perigo”, gritou a autoridade máxima.

O molusco, que havia descoberto que sua concha era uma proteção, mas o impedia de viver tamanhas experiências, começou a contar para os outros o que tinha acontecido com ele e como essa grande tempestade  o fez perceber que a vida ia além de sua concha de segurança. Ele não estava interessado em converter ninguém para tirar suas conchas, apenas queria viver dessa forma, que era arriscado, mas trazia uma liberdade imensa.

Começou pelos mais jovens, que começaram a tirar suas conchas para sentir as ondas que quebravam nos recifes; depois, por aqueles que não se encaixavam nessa vida nos corais. A revolução empurrou o Grande Conselho dos Moluscos a tomar uma decisão inédita: Aqueles que retirassem suas conchas deveriam ser expulsos do arrecife. Representavam um grande risco para o sistema e para os mais jovens, expondo-se ao perigo de não carregar as pesadas e protetoras conchas em suas costas.

E assim, o foi. Expulsaram o viajante e aqueles que se recusaram a colocar as conchas de volta, que foram lançados ao mar e arriscaram-se a viver sujeitos à natureza e a tudo o que ela traz consigo: vida, ondas, chuvas, tempestades, sol, novas paisagens, novas sensações, perigos e aquela maravilhosa descoberta que pode-se viver sem as conchas, que os tornavam uniformes.

Não há nenhuma promessa ou milagre por trás de nos tornamos nós mesmos.

Não ganharemos prêmios, não seremos reconhecidos pelas autoridades e comunidade como seres maravilhosos. Ao contrário, somos um risco para aqueles encouraçados que não conseguem imaginar o mundo sem as conchas. Então, o que vale? Vale por poder nadar no mar, vivências ondas, experimentar novas sensações e ao fim, reconhecer-se como um ser humano e não como uma concha, que continha algo dentro.

As grandes tempestades da vida nos alcançam, quando não conseguimos por nós mesmos deixar as conchas para trás e experimentar novos sabores e olhares para a vida. Então, como um turbilhão de vida, as tempestades arrancam à força nossas proteções, mexe com nosso estilo de viver, derruba nossas personalidades de proteção e nos lança num mar de novas experiências. Depende de nós, olhar para esta nova realidade e entender que podemos viver diferente ou sair loucamente desesperados por uma nova concha protetora. Não há respostas fáceis ou certas, apenas a grande aventura de dizer “SIM” para a vida!

Certamente não faltarão censores e portadores da “verdade” que tentaram nos conformar com a visão “correta” da vida. Vale mais escutar a intuição e o próprio coração, que sair a busca de soluções mágicas ou de mestres. O verdadeiro mestre mora dentro de nós, fora da concha.

Ao deixamos nossas conchas para trás precisamos olhar para nós mesmos com um novo olhar e procurar reconhecer que a experiência de viver é muito mais intensa e forte e

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Ao deixamos nossas conchas para trás precisamos olhar para nós mesmos com um novo olhar

que a concha não somos nós, mas por um tempo nos ajudou a viver e quando e quando estamos prontos, podemos deixa-la e mergulhar nas águas da vida com mais sabor.